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Comunicar-se na casa comum: ir além da denúncia para chegar ao anúncio de um mundo novo

Aloir Pacini, sJ (padre jesuíta e assessor das CEBs/arquidiocese Cuiabá-MT)

A vegetação diferente em Roma (Pinus elliottii)

Confira relato sobre atividades complementares à programação oficial do Sínodo da Pan-Amazônia, que ocorre em Roma. São ações organizadas pela tenda “Amazônia: Nossa Casa Comum”. Acompanhe o relato do dia 16.

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O mapeamento das experiências no Congo (Reseau Ecclesial Du Bassin Du Congo – REBAC) como outro bioma a ser preservado nos deixou despertos neste dia. Os esforços estão acontecendo também naquela região como na Amazônia. Lá como aqui, a exploração de ouro e diamantes parece ser a maior desgraça, porque deixa os rastros de devastação.

Parece que as histórias das tragédias da colonização aparecem em todos os lugares. Devem ser contadas, cantadas e dançadas com os ritmos e as cores de cada etnia ou nação em formas de comunicação transformadora, para que não mais aconteçam. O ser humano tem que ser capaz de aprender e enxergar todos os seres humanos como irmãos, esse é o grande aprendizado deste Sínodo.

A tarde toda no auditório da Rádio Vaticano foi ocupada com um painel de jornalistas e especialistas em comunicação com a pergunta: Como comunicar a ecologia integral e os estilos de vida sustentáveis? 

 

“Mais sustentável é utilizar o que pode ser encontrado perto, pois gastamos muita energia levando materiais de um continente”

 

Precisamos ser humildes neste caminho, pois as distorções de proporções são frequentes no nosso modo de perceber o que está em torno de nós. As chuvas acontecem tradicionalmente mais na linha do Equador, mas também nestes lugares as pessoas têm menos acesso à água potável. Isso está relacionado com o material biodegradável pelas águas, algo que tem sua lógica própria.

Por isso, nossas reflexões indicam que o material que está sendo usado, por exemplo, para construir nossas casas, precisa ser melhor pensado. As cidades são construídas em todas as partes do planeta usando materiais mais e menos duráveis. Mais sustentável é utilizar o que pode ser encontrado perto, pois gastamos muita energia levando materiais de um continente para o outro sem necessidade, como vemos os mármores, aqui em Roma.

 

Pé de guaraná

Francisco Chagas (Apurinã), que plantou um pé de guaraná no jardim do Vaticano, voltou a falar que sua terra não está demarcada e, por isso, sofre com seu povo todo tipo de invasão: madeireiros, garimpeiros, caçadores etc.

“Não temos mais como fazer nossas casas tradicionais, porque falta material. Trabalhamos com o guaraná que é nossa planta sagrada. Nós cuidamos da terra-mãe desde sempre, porque temos respeito. Para fazer roça, pedimos licença para a mãe-terra. Explicamos que vamos plantar banana, mandioca, milho para ter alimentos. Não tenham pena de nós, mas vejam como defender nossos direitos e da mãe-terra!”

Depois dessa fala, fizemos um minuto de silêncio para nos conectarmos conosco mesmos, para ver o que devemos e podemos mudar na nossa vida.

Conheça um pouco da história sagrada do guaraná a partir das palavras do seo Honorato Lopes Trindade, do povo indígena Sateré-Mawé, no vídeo abaixo.

Os jornalistas podem fazer algo melhor

Podemos trabalhar a favor da casa comum como bem viver para todos, usando as palavras mais adequadas. Como a atividade era sobre a comunicação, pensamos que, juntos, os jornalistas podem fazer algo melhor do que se faz hoje na Amazônia, focar a coleção de experiências das pessoas em suas práticas de vida sustentável, suas inspirações e memórias.

As histórias de conflitos não atraem a imprensa, por isso os comunicadores precisam encontrar “novas histórias”, uma vez que tudo está conectado e a ecologia integral auxilia a termos inspirações espirituais para sermos melhores do que fomos ontem. O guaraná orgânico Urupadí, da Associação dos Agricultores Familiares do Alto Urupadí, cultivado e preparado de forma cooperativa em Maués (estado do Amazonas) é uma experiência que deve ser multiplicada.

 

“Os cientistas estão dizendo a mesma coisa que os indígenas, mas de forma diferente”

 

Também foi mostrada a edição impressa do “Guia prático para jornalistas sobre estilos de vida sustentáveis. Com inspiração, dicas de escrita e ideias gráficas.” Em várias línguas, pode ser encontrado também em forma digital. Os cientistas estão dizendo a mesma coisa que os indígenas, mas de forma diferente. A biosfera é o “casaco da Terra”, mas é frágil, tem grossura da casca de uma uva. A verdadeira magnitude de todos os seres na Terra não é ainda conhecida.

Os glóbulos vermelhos estariam na mesma proporção em relação ao nosso corpo, como nós, cerca de 7 bilhões de pessoas, estamos em relação com o planeta Terra. Mas nosso poder de destruição é maior que qualquer vírus ou bactéria. A cada ano, destruímos 25 vezes mais que o espaço que ocupamos nesse planeta.

 

Memória celular

Os Guaranis, Chiquitanos, Ticunas e outros possuem mitos de dilúvios (histórias sagradas) para falar das formas como a natureza se utiliza para limpar a terra da nossa poluição. Quando ela se deita, a água inunda tudo e os peixes ou outros seres passam a ter mais domínio que nós. De certa forma, mantemos a memória celular desses acontecimentos pretéritos, pois somos seres relacionais e vibramos na mesma frequência que a natureza, pois tudo está interligado.

Parece que esquecemos isso ao viver na cidade, que não permite o contato com a mãe-terra. Como Deus “sujou as mãos” para criar o ser humano da terra, também temos que sujar as mãos e os pés para cultivá-la.

 

Rede Amazônica de Comunicação

No final desse dia, fizemos um círculo para poder ver os rostos dos nossos irmãos e irmãs de forma mais pessoal e criar uma comunicação popular enquanto Rede Eclesial Pan-Amazônica (Repam). A Rede Amazônica de Comunicação deseja fazer a experiência de ir além da denúncia para chegar ao anúncio da esperança de um mundo novo, outros mundos possíveis.

O Sateré-Mawé Honorato deixou uma mensagem e cantou: A nossa vinda aqui / Junto dos vossos pés / Viemos pedir fortaleza a fé. / Nosso senhor São Pedro (bis)/ Abra a porta da tua casa / E faze-nos entrar / Junto comigo vem rezar. / Tu tendes chaves do céu (bis) / Contra as forças destas chaves / A porta do inferno nunca prevalecerá.

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