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PJ festeja 35 anos de caminhada, para sair em missão, desde a memória construída coletivamente.

Qual é o papel que a juventude tem na sociedade e na Igreja? Realmente podem exercer um papel protagonista, ou são relegados na hora das decisões?

Se tem uma coisa que sempre marcou a caminhada da Pastoral da Juventude – PJ, foi sua luta pelo protagonismo e empoderamento juvenil, o que não poucas vezes provocou conflitos dentro da Igreja. No Regional Norte 1 a PJ está comemorando 35 anos de existência, e para isso, mais de duzentos jovens tem se encontrado em Itacoatiara – AM, de 25 a 28 de julho, para participar do 8º Encontro Regional da Pastoral da Juventude.

No encontro se fizeram presentes três elementos importantes, a festa, a memória e a missão. Ao respeito deles, a Irmã Elsie Vinhote, assessora da PJ, reconhecia que existem “motivos de festa, de alegria da juventude da Amazônia, a pesar das dificuldades que o jovem passa”. Segundo a religiosa, “o motivo de ser festivo do jovem da Amazônia está na própria cultura, na sua própria maneira de ser”. Por isso, o encontro tem levado a “celebrar por ter vida diante de tantas ameaças à vida da juventude”. Em seus 29 anos de caminhada no meio da Pastoral da Juventude, desde que começou acompanhar um grupo de base, e depois as outras instâncias da PJ, ela faz memória desde “o significado do acompanhamento, de fortificar a fé para enfrentar dificuldades, de resistência, de eclesialidade e vivência da cidadania”, insistindo em que “a PJ firma nos jovens sua identidade, o protagonismo juvenil, a sua eclesialidade e missão na Igreja e na sociedade”.

Na hora de falar de missão dos jovens, a religiosa reconhece que “uma das dificuldades é o próprio tempo dos jovens e a preparação para dominar diversos temas ou assuntos”. Ela coloca como exemplo o mundo da droga, dizendo que “é difícil tentar tirar outro jovem desse vício, dessa marginalidade porque às vezes ele não tem os mecanismos ou os meios suficientes que sustentam”. A reflexão que surge daí é que “falta formação nessas áreas de fronteira, de situações de risco”, afirmando que “mesmo não sendo todos, há jovens que se envolvem, que tem um pouco mais de profetismo, de formação, de ousadia, talvez não tenham as soluções mas eles tem a presença”.

A importância do 8º Encontro da Pastoral da Juventude do Regional Norte 1, segundo Dom Tadeu Canavarros, bispo auxiliar de Manaus e referencial da juventude no Regional, “está na própria celebração, que vai envolvendo todo o Regional, as nossas diversas Igrejas que compõem o nosso Regional são enriquecidas por esta voz da Pastoral da Juventude de uma maneira especial”. O bispo auxiliar de Manaus destaca a “tríade que eles escolheram, baseado na festa, que é essa dimensão bastante juvenil, que nós encontramos de uma maneira muito caraterística na pessoa do jovem, depois essa dimensão da missão, do Evangelho, de levar a evangelização sempre a frente, e a memória, baseado na construção dos inúmeros pastores e jovens que abraçaram essa causa da juventude e que levam para frente”. Nessa dimensão, “celebrar tudo isso nesse contexto de 35 anos nos ajuda sempre a ouvir o clamor dos jovens”, segundo Dom Tadeu.

Neste tempo inter sinodal, entre o Sínodo da Juventude e o Sínodo para a Amazônia, o papel da juventude, segundo o bispo, é “de principal protagonista”. Se referindo à frase do Papa Francisco, “não tenham medo de avançar para o futuro desconhecido”, Dom Tadeu afirma que “esse futuro, na região amazônica, está exatamente na mão dos jovens, que já desde agora começam a tomar atitudes concretas para realmente passar da lógica da espoliação para uma lógica do cuidado, assumir de fato todo o cuidado com a Casa Comum, toda a dimensão de preservação e viver daquilo que a floresta oferece sem, de fato, destruir”. O bispo referencial da juventude, vê os jovens como “vozes proféticas, porque lutam e persistem nessa caminhada”. Igualmente, o bispo local, Dom José Ionilton Lisboa de Oliveira, reconhecia a PJ como “uma força viva na Prelazia”, fazendo memória da música de Zé Martins que diz “eu quero ver, eu quero ver, eu quero ver a juventude acordar, eu quero ver, eu quero ver, todo jovem ocupando seu lugar”.

O encontro pretendeu, segundo Luiz Filipe Fialho, Secretário Regional da Pastoral da Juventude, “celebrar o caminho que foi conduzido por muitos pés e hoje está sendo caminhado por nós”. Ele reconhece que “o nosso posicionamento, a nossa opção preferencial pelos jovens vai interferir em gerações futuras, e esse processo, a Pastoral da Juventude vive um processo que é de ciclo, a gente percebe que esse ciclo vai se renovar com outros pés”. O Secretário Regional afirma que “a gente está aqui para festejar e depois sair em missão, a partir dessa memória que a gente constrói coletivamente”.

Desde essa perspectiva histórica, Luiz Filipe Fialho destaca que “hoje a missão da Pastoral da Juventude na Amazônia, sobretudo, que não é uma missão nova, mas que é uma missão que é permanente para a gente é construir políticas públicas, para a juventude indígena, para a juventude ribeirinha, para a juventude do meio urbano, porque a gente acredita que construindo e pautando a vida da juventude, com projetos e políticas públicas voltados para o bem viver, em uma construção coletiva, a gente está construindo um pouquinho da civilização do amor aqui nas terras amazônicas”.

Nesse mesmo sentido, o Secretário Nacional da Pastoral da Juventude, Davi Rodrigues, presente no encontro, afirmava que “a juventude da Amazônia, ela tem o ponto de vista fundamental para a Igreja do Brasil e para a Pastoral da Juventude brasileira”. Segundo ele, “a juventude da Amazônia, assim como a Igreja da Amazônia, tem muito a nos ensinar a partir de experiências sinodais, da vida do povo, do cuidado da Casa Comum, do cuidado com a vida”, chegando a dizer que “hoje seria a grande chave de leitura para o mundo, a Igreja da Amazônia”.

Na Amazônia, a presença do mundo indígena ainda é muito marcante em muitas regiões do interior. Nesse sentido, Luciane Mendes de Lima dizia que “para mim como indígena, a Pastoral da Juventude abre portas, no sentido da gente ter voz e procurar ter o nosso lugar dentro da sociedade, porque dentro do contexto da Pastoral da Juventude, ela nos ensina a lutar pelo nosso ideal, a lutar por outros jovens que não tem oportunidades, que ainda não conhecem e buscam, e têm medo”. A jovem do povo tariano afirma que “a Pastoral da Juventude tem esse papel de incentivar nós indígenas, nós jovens, a lutar pelo nosso futuro, não somente por ser indígena, mas por ser jovem”. Ela reconhece que “a Pastoral da Juventude me ensinou a falar o que eu penso, a lutar pelo que eu quero, e também lutar por aqueles que são capazes de ter um futuro e um espaço dentro da sociedade”.

A Leitura Popular da Bíblia, um aspecto presente nos grupos da PJ e que foi trabalhado durante o encontro, “além de inspirar no dia a dia, a gente vive uma juventude que está em busca de algo, não quer dizer que ela não busca, ela está em busca de algo, e aí a Palavra de Deus vem como uma essência para aquilo que eu estou buscando, ou às vezes uma resposta”, afirma Elaine Cristina Cardoso. Segundo ela, “eu preciso me encontrar, eu nem sei o que estou procurando, eu preciso me ouvir e a Palavra de Deus proporciona essa escuta também pessoal, além de ser uma escuta de uma conversa com Deus é uma escuta de mim mesmo e do que a sociedade está dialogando”. É por isso que considera “a Palavra de Deus é muito rica porque ela proporciona um diálogo comigo, com Deus e com a sociedade, ela é essencial na vida da juventude”.

A Pastoral de Juventude é uma história de rostos concretos, Francisco Andrade de Lima, atualmente Secretário Executivo do Regional Norte 1, é alguém que participou dessa caminhada. Desde sua visão, nesses 35 anos, a PJ “tem sido uma esperança para a Igreja”, afirmando que “a juventude tem seus anseios, que as vezes, pela infraestrutura da Igreja, não cabe nessa Igreja fechada, e a Pastoral da Juventude tenta ir ao encontro desses jovens do jeito que eles são, e isso cria um espaço de acolhida dessa juventude”. Em um mundo atual cheio de desafios, “a Pastoral da Juventude tenta trabalhar esse contexto que a juventude vive, sempre a partir da realidade do jovem, no contexto que ele está, e procurando trabalhar para que esse jovem se sinta acolhido”, afirma Francisco Andrade de Lima.

Desde uma perspectiva muito presente no processo do Sínodo para a Amazônia, o protagonismo feminino na Igreja amazónica, tem sido motivo de reflexão no encontro. Uma das participantes da mesa redonda sobre o tema foi a Irmã Rose Bertoldo, que reconhece que “para a juventude é muito importante debater sobre isso, porque infelizmente as mulheres, principalmente as mulheres jovens, são invisibilizadas no trabalho que elas realizam nas comunidades”. Desde essa perspectiva, ela afirma que “precisa não só dar visibilidade, mas como empoderar as mulheres jovens para que ocupem espaços nessas comunidades onde estão presentes”.
Além do trabalho nas comunidades, a religiosa insiste igualmente “no trabalho que ela ocupam em outros espaços, por exemplo nas universidades, mesmo na questão da política, que foi um dos temas que foi muito debatido, os outros espaços de formação nas políticas, nos conselhos”, afirmando que “é essa a dimensão que a gente precisa trabalhar com a juventude, empoderar para que possam assumir esses espaços de forma consciente e fazer a diferença enquanto mulheres”. Junto com isso, ela destaca “a importância da participação, principalmente das mulheres jovens, nesse processo todo da escuta sinodal, e ainda influenciar os padres sinodais para que levem a voz das mulheres para o Sínodo para a Amazônia”.

O Sínodo para a Amazônia, que realmente se mostrou entre os jovens participantes como um momento de mudança, de novos caminhos, esteve presente nas oficinas realizadas no 8º Encontro Regional da Pastoral da Juventude, assim como o Sínodo da Juventude, celebrado em 2018. Junto com isso, foi refletido sobre a cultura do descarte, o protagonismo feminino, a espiritualidade libertadora, a violência contra a mulher ou a história da PJ, dentre outros temas. São elementos que ajudam os jovens a tomar consciência sobre realidades muito presentes em suas vidas e que os levam a ser missionários, a sair sem medo nas ruas para fazer memória de quem deu a vida pela Amazônia, para lembrar a tantos jovens que hoje são martirizados pela violência, da qual muitas vezes o estado se torna cúmplice.

As palavras do bispo local, Dom José Ionilton Lisboa de Oliveira, na missa de envio, lembrando a mensagem do Papa Francisco aos jovens na Jornada Mundial da Juventude no Rio de Janeiro, “Ide, sem medo, para servir”, representam um desafio para os jovens presentes no 8º Encontro Regional da Pastoral da Juventude e para seus grupos de base, para se colocar “ao serviço da missão de Jesus, para a construção de uma sociedade mais justa, mais humana, mais profética”. O bispo de Itacoatiara destacou a importância do Sínodo para a Amazônia, a busca de novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral neste chão amazônico.

Luis Miguel Modino

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