Por Celso Carias, do site da Revista Senso.
Desde o final da década de sessenta do século vinte, momento de nascimento das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), até os nossos dias, o contexto no qual elas apareceram foi sofrendo alterações significativas, com consequências, evidentemente, para as suas caminhadas.
As CEBs, enquanto fenômeno social, é parte de um processo fundamentalmente eclesial, isto é, parte de uma interpelação da realidade social, política, econômica e cultural, mas se desenvolve dentro das estruturas institucionais cristãs. Assim sendo, não se pode compreender as CEBs hoje sem um olhar histórico em torno das transformações tanto na sociedade quanto nas instituições eclesiais.
As Comunidades de Base nascem na América Latina e podemos caracterizá-las em três eixos principais: um primeiro referente à participação dos fiéis na estrutura de decisão, na Igreja Católica, motivado pela abertura dada pelo Concílio Vaticano II; um segundo no qual se procura construir uma espiritualidade de seguimento de Jesus Cristo, que se expressa nas diversas dimensões simbólicas, como, por exemplo, a liturgia, e um terceiro, mais conhecido, que é a inserção forte na realidade política e social em perspectiva da construção de um mundo mais justo e solidário.
Neste processo, a Teologia da Libertação tem sido a concepção teológica que norteia a caminhada reflexiva das Comunidades. E as objeções que surgiram a essa teologia no âmbito eclesial respingaram nas CEBs. Assim sendo, foi se constituindo uma presença na qual elas entraram para o campo da resistência.
Por outro lado, na sociedade como um todo, também aconteceu mudanças. O neoliberalismo foi se constituindo com um paradigma de estruturação social que provocou um debate no qual as concepções de maior inserção na realidade social e política começaram a ser catalogadas como um empecilho ao progresso econômico.
Por sua vez, os governos progressistas, que foram se instalando na América Latina, não souberam manter um processo pedagógico no qual a Base continuasse a ser o grande eixo norteador da prática e da teoria. Consequentemente, chegamos a uma situação de fragilidade.
As CEBs não morreram, como alguns arautos das elites eclesiais e políticas desejaram, mas não há dúvida de que foram impactadas pelo processo de exclusão popular nas decisões. Mantiveram-se buscando articulação, realizando inclusive encontros nacionais no Brasil e em outros países da América Latina, como os Intereclesiais, isto é, encontros nos quais a partir da representação das estruturas institucionais, delegados e delegadas buscam continuar motivando a caminhada. O último no Brasil foi o 14º Intereclesial das CEBs na Arquidiocese de Londrina, PR, realizado em janeiro de 2018. O próximo está marcado para Rondonópolis, MT, possivelmente em 2022.
Agora, sob o pontificado do Papa Francisco, as CEBs ganharam outro ânimo e retomaram o projeto de construção de uma nova sociedade como consequência do seguimento de Jesus Cristo. Contudo, trata-se agora de um novo contexto e de uma situação na qual as Comunidades se fragilizaram. Assim, tem se constituído um processo de avaliação com a característica de uma ressignificação.
Percebe-se que o modelo de comunidade das décadas de setenta e oitenta não possui mais as mesmas condições de possibilidade daquela época. Verifica-se a necessidade de formação de novos quadros, novos assessores e assessoras, pois o envelhecimento, sem renovação, dos quadros históricos é latente, havendo certa elitização e distanciamento das bases. Constata-se que não se pode pensar as lutas sociais separadas das angústias existenciais vividas por todo ser humano. Urge a renovação de métodos e de uma relação mais profunda com a realidade cultural popular. E, nesse sentido, a própria Teologia da Libertação precisará se renovar para continuar sendo a base teórica deste processo.
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