ARTICULAÇÃO CONTINENTAL DAS COMUNIDADES ECLESIAIS DE BASE.
Benedito Ferraro
O Serviço da Articulação Continental é um esforço de articular as CEBs do Continente de maneira que nos ajude a:
Recolher, sistematizar e compartilhar as experiências mais significativas das CEBs de todo o Continente.
- Animar a rede de assessores e assessoras das CEBs e seu serviço.
- Incentivar uma melhor formação em todos os níveis das CEBs.
- Promover a comunhão inter-eclesial.
- Receber e assumir as inquietudes mais comuns que surgem das CEBs.
- Animar a atenção e abertura dos novos campos de missão: jovens, migrantes e aquele que na realidade pareça ser prioritário.
- Compartilhar, em todo o continente ganhos, materiais, processos de formação, experiências, resultados dos processos nacionais e regionais que possam ajudar em nível nacional, regional e continental.
- Ser uma instância de diálogo com os diferentes espaços alter-mundistas globais”.
O Secretariado executivo conta com pessoas que possam dar conta do serviço que se lhe confia. Além disso, existe o Conselho de consulta e discernimento, constituído por uma pessoa representativa de cada região. No VI Encontro latino-americano e caribenho celebrado no México, no ano de 2004, as comunidades eclesiais de base se organizaram em nível regional em seis regiões:
REGIÕES |
PAÍSES |
Norte: | México, Estados Unidos |
Centro-américa: | Guatemala, El Salvador, Honduras, Nicaragua,
Costa Rica e Panamá |
Caribe: | Venezuela, República Dominicana e Haití |
Andina: | Colômbia, Bolívia, Peru, Equador |
Brasil: | Brasil |
Cone Sul: |
Argentina, Chile, Paraguai, Uruguai |
Levando em consideração essa compreensão, queremos fazer algumas considerações:
- Distinção entre Articulação e Coordenação.
Achamos importante distinguir, em relação ao processo das CEBs, os dois termos que geralmente usamos e sua operacionalidade: Articulação e Coordenação.
O primeiro é uma criação nossa – latino-americana e caribenha – em nível local, regional e continental. Não é expressão de um poder hierárquico, dado por “ordenação sacramental”, senão uma responsabilidade que surge da comunhão fraterna das CEBs. Estamos operando coerentemente com a realidade de ser Povo de Deus (Koinonia) a serviço do qual existe a Diakonia (diferentes ministérios e assessorias).
A coordenação expressa concretamente o que corresponde ao ministério de Unidade na diversidade das iniciativas e responsabilidades. Cabe, na tradição eclesial, ao ministro ordenado (epíscopo-presbítero). Assim, a coordenação das CEBs, em sentido canônico e teológico (pelo menos por tradição), é responsabilidade da Igreja local.
A articulação é a co-responsabilidade que complementa as Igrejas locais no âmbito mais amplo de um país ou continente, no que diz respeito ao Reino de Deus, à missão que atravessa os espaços delimitados pela estrutura eclesial oficial.
A legitimidade da Articulação está relacionada com o conceito de Povo de Deus e baseada na igualdade fundamental expressa pela LG,32: “Um é pois o Povo eleito de Deus: “Um só Senhor, uma só a fé, um só batismo” (Ef 4,5). Comum a dignidade dos membros pela regeneração em Cristo. Comum a graça de filhos e filhas. Comum a vocação à perfeição. Uma só a salvação, uma só a esperança e indivisa a caridade. Não há, pois, em Cristo e na Igreja, nenhuma desigualdade em vista de raça ou nação, condição social ou sexo, porquanto “não há judeu ou grego, não há servo ou livre, não há varão ou mulher, porque todos vós sois um em Cristo Jesus” (Cf. Gl 3,28; Col.3,11).
Esta igualdade fundamental se apoia na fé e no batismo, na esperança e na crisma, na caridade e na eucaristia (cf. LG,32), explicitada nas três dimensões da ministerialidade eclesial:
1°.) Participação na dimensão profética (LG, 12): Vivência coerente da fé no cotidiano em todos os ângulos.
2°.) Participação na dimensão sacerdotal: O Povo de Deus é conjuntamente sacerdotal, com base no sacerdócio comum (cf. LG., 8).
3°.) Participação na função real: Na relação Igreja – Reino, superação da separação dentro e fora (cf.GS, 1.11). A LG, 30 afirma que os pastores “não foram instituídos por Cristo a fim de assumirem sozinhos toda a missão salvífica no mundo. Seu preclaro múnus é apascentar de tal forma os fiéis e reconhecer suas atribuições e carismas, que todos, a seu modo, cooperam unanimemente na obra comum”. Como Povo de Deus, todos/as têm a responsabilidade missionária (cf. RMi,: “A missão compete a todos os cristãos/ãs”. Por isso, há unidade e diversidade como na Trindade (Cf. LG,12; 1Cor 12,7)”.
- Articulação: Originalidade da expressão latino-americana e caribenha.
Presentes, inicialmente, em vários países como experiências de Igrejas locais (Barra do Pirai-RJ; Natal-RN, com S.Paulo do Potengi; Ribeirão Preto-SP, com Cravinhos; Fortaleza-CE, com Pirambú, no Brasil; Panamá com San Miguelito; Choluteca em Honduras; Rio Bamba no Equador; Altiplano boliviano, entre outras), as CEBs foram, oficialmente, assumidas pelos bispos em Medellín e lançadas em nível continental: “Assim, a comunidade cristã de base é o primeiro e fundamental núcleo eclesial, que deve, em seu próprio nível, responsabilizar-se pela riqueza e expansão da fé, como também pelo culto que é sua expressão. É ela, portanto, célula inicial de estruturação eclesial e foco de evangelização e atualmente fator primordial de promoção humana e desenvolvimento” (Med,15,10). Puebla reassumiu as CEBs: “As Comunidades Eclesiais de Base são expressão do amor preferencial da Igreja pelo povo simples; nelas se expressa, valoriza e purifica sua religiosidade e se lhe oferece oportunidade concreta de participação na tarefa eclesial e no compromisso de transformar o mundo”(Puebla, 643; cf. 641). Aparecida reafirma Medellín (cf. Aparecida, 178) e confirma que “as comunidades eclesiais de base, no seguimento missionário de Jesus, têm na Palavra de Deus como fonte de sua espiritualidade e a orientação de seus pastores como guia que assegura a comunhão eclesial. Demonstram seu compromisso evangelizador e missionário entre os mais simples e afastados e são expressão visível da opção preferencial pelos pobres. São fonte e semente de variados serviços e ministérios a favor da vida na sociedade e na Igreja” (Aparecida, 179).
É essa força viva das Comunidades Eclesiais de Base que motiva o Serviço de Articulação Continental das CEBs: “Nestas comunidades, embora muitas vezes pequenas e pobres, ou vivendo na dispersão, está presente o Cristo, por cuja virtude se consocia a Igreja una, santa, católica e apostólica” (LG,26). Pela presença de leigos e leigas que exercem nas CEBs diversos ministérios e serviços eclesiais, a Igreja se faz presente e operosa naqueles lugares e circunstâncias onde apenas através deles ela pode chegar como sal da terra (cf. LG, 33).
A originalidade da expressão latino-americana e caribenha – Articulação – está na consciência de que, mesmo existindo situações conflitivas e conflituosas entre a hierarquia e os participantes das CEBs em vários países da América Latina e Caribe, buscam-se sempre novas relações eclesiais de igualdade, de amizade fraterna e de trabalho em comum. Há um espírito e uma prática de colegialidade e de corresponsabilidade nas CEBs. Neste sentido, este Serviço de Articulação faz, hoje, o papel feito por outros grupos no cenário da história da Igreja. Podemos nos lembrar da busca da unidade de fé e missão junto aos padres do deserto, junto aos mosteiros (São Bento). Das Igrejas monacais, que não se reduziam apenas aos monges, mas incluíam o povo cristão da área, nos séculos IV e V, saem os missionários que foram à Inglaterra, à Irlanda e à França. Além de Cirilo e Metódio, já no século VIII, foram entre os povos eslavos. Este caminhar indica a criatividade do Povo de Deus na história. Mostra também que o Serviço de Articulação Continental das CEBs se insere na legítima tradição eclesial das Igrejas responsáveis de ir aos confins da terra, segundo o pedido de Jesus (cf. Mt 28,18-20). Este é o caminho inspirado pelo Espírito tendo como fruto uma nova experiência eclesial na América Latina e Caribe, que age com criatividade, rejeitando o esquema piramidal e, sem romper com a comunhão, busca novas formas de relações fraternas e solidárias. O Serviço de Articulação Continental das CEBs não faz planos para que as instâncias das Igrejas locais os apliquem. Recolhe e discerne o que o Espírito realiza nos mais diferentes rincões da América Latina e Caribe, com a ajuda das melhores assessorias bíblica, teológica, moral, pastoral, política, econômica e comunicativa.
Ao longo dessas últimas décadas foram sendo criadas novas estruturas eclesiais, tornando possível a participação de todos e a promoção de novos ministérios, que vivificam e dinamizam ainda mais as comunidades. Isto aconteceu com a Articulação Continental das CEBs que, iniciando-se, em 2001, em La Rioja, Argentina, vem recebendo, nos últimos anos, a confirmação por parte do CELAM, em sua Secção de Paróquias, CEBs e Pequenas Comunidades (cf. Propuestas del Tercer encuentro de los bispos responsables de las CEBs com la Articulación Continental, Santiago de Chile – 10-12 de mayo de 2011).
2. Criação de novas comunidades eclesiais de base.
A igreja local tem a responsabilidade de gerar CEBs, assim como gerou paróquias, no momento histórico em que o Povo de Deus estava vivendo uma situação na qual era importante novas estruturas na dimensão comunitária de base. Isso é o que agora está acontecendo novamente. A articulação não é criação de um novo ministério eclesiástico, nem uma expressão de poder hierárquico. É a co-responsabilidade do Povo de Deus que, pelo Sensus Fidelium e força do Espírito, cria o que no existia. Essa relação entre autonomia e comunhão, embora com momentos de conflitividade, pode dar à Igreja de Jesus Cristo a possibilidade de captar todas as potencialidades presentes na capilaridade da vida cotidiana e que os pastores nem sempre têm as condições de captar.
A partir das Propostas do Terceiro Encontro de Bispos Responsáveis das CEBs com a Articulação Continental, queremos ressaltar: “Afirmamos e testemunhamos o que são as Comunidades Eclesiais de Base, em relação a sua identidade”:
- As CEBs são expressão viva da “koinonia”, a imagem da comunhão Trinitária entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo.
- O centro de tudo é a pessoa de Jesus que veio anunciar-nos o projeto do Pai, o Reino de Deus.
- As Comunidades são fraternas e abertas, comprometidas com os pobres, a justiça e o bem comum, na luz do magistério da Igreja, particularmente no da Doutrina Social.
- Vivem a fé, em comunidade e de maneira profética assim como missionária.
- Nesta experiência eclesial se promovem e propiciam os ministérios e serviços dos leigos e leigas, em comunhão e corresponsabilidade com os Pastores.
Em relação à missão das CEBs, os bispos realçam as seguintes notas:
- As CEBs como comunidades de batizados são chamadas a ser presença capilar da Igreja e a dar testemunho do amor de Deus em todos os âmbitos da sociedade (RM 50-51).
- As CEBs reafirmam a opção preferencial e evangélica pelos pobres prestando particular atenção aos novos rostos e contextos de pobreza, “para que nossos povos tenham vida em Cristo”…
- Fiéis ao espírito de Aparecida as Comunidades estão chamadas a continuar com audácia a relançar as CEBs e propiciar o surgimento de novas CEBs, fiéis à sua identidade de pequena Igreja.
- As CEBs privilegiam e acompanham as famílias, em suas diversas situações diante das ameaças e ataques representados por certas correntes da cultura moderna; diante da crise econômica e de outras realidades precárias.
- As CEBs enfrentam o desafio de uma inserção “inculturada” e criadora no mundo urbano e na realidade dos jovens.
- Respondendo aos sinais dos tempos comprometem-se ativamente com o cuidado e defesa da criação (ecologia, meio-ambiente).
- De igual maneira se esforçam para apoiar as organizações e movimentos sociais que lutam e se comprometem com uma vida digna para todos.
- Como comunidades de base, abertas e acolhedoras, favorecem de maneira espontânea o diálogo inter-religioso e ecumênico.
3. Articulação Continental e o desafio de uma Articulação Mundial das CEBs.
Serviço humilde e esperançoso, a Articulação Continental das CEBs tem alcançado colocar em prática uma efetiva e sólida articulação geral, em comunhão com as articulações regionais e locais. Tem havido uma acolhida respeitosa pelas Igrejas da África, da Ásia, da Europa e da Oceania ao afirmarem que se inspiram no caminhar latino-americano e caribenho das CEBs. Não seria essa também a dimensão profética e missionária das CEBs no mundo de hoje?
Benedito Ferraro
Assessor da Articulação Continental das CEBs.
Quero agradecer as propostas enviadas pelo Pe. José Marins e pela Ir. Teolide Trevisan. Sem a ajuda deles, a reflexão seria empobrecida.
Campinas, 12 de dezembro de 2017 – Dia de Nossa Senhora de Guadalupe, Padroeira da América Latina.
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