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Secretário da REPAM denuncia: Governos “autoproclamam-se os novos Herodes” da Amazônia.

Advento é tempo para ser voz que clama no deserto, na Amazônia, que denuncia “a negligência das autoridades locais, o conformismo, a cumplicidade com esses interesses que tiram a possibilidade da vida acontecer”

O Advento é um tempo de espera, de preparação para acolher, onde estamos, nos lugares onde vivemos nosso dia a dia. A partir daí, Mauricio Lopez, Secretário Executivo da Rede Eclesial Pan-Amazônica – REPAM, pergunta: “O que significa o Advento na Pan-Amazônia, que sentido faz esperar a chegada de uma promessa de esperança para os povos da Amazônia? “

Sua resposta surge da necessidade de nos colocarmos no contexto, de olhar do jeito da Trindade”, seguir a lógica dos Exercícios Espirituais, que nos lembra que “somos convidados a reconhecer os rostos reais, a vida das pessoas, suas alegrias, suas dores, suas lutas, suas esperanças, o nascimento de novas possibilidades e a morte concreta que acontece no meio da realidade”. É lá onde “o próprio Deus como Trindade, em seu projeto de amor à vida, em seu projeto para o futuro, decide se encarnar e tornar-se um no meio da realidade”.

Esta é uma encarnação que surge “do chamado a fazer redenção do gênero humano, voltar ao seu sentido, trazer sinais de vida e possibilidade de futuro para todos os que vivem lá”, diz o Secretário-executivo da REPAM. Portanto, no âmbito da Amazônia “é evidente que nós temos sinais de opressão, morte, todo o poder do Império, das autoridades locais, que continua pesando sobre esta realidade”, disse Mauricio Lopez, que vê “o grande império desse modelo extrativista, de um capitalismo voraz, que está removendo cada vez mais, tirando a possibilidade de vida e futuro a  mulheres e homens, especialmente os povos indígenas, camponeses, que vivem na Amazônia, mas também a remoção de possibilidades de vida para as próprias espécies, flora e fauna, que fazem parte desse complexo, que constrói e constitui esta Amazônia.”

Advento é tempo para ser voz que clama no deserto, na Amazônia, que denuncia “a negligência das autoridades locais, o conformismo, a cumplicidade com esses interesses que tiram a possibilidade da vida acontecer”, disse o Secretário Executivo do REPAM. Uma atitude urgente diante dos governos, segundo o Secretário da REPAM, que “em toda a realidade Pan-Amazônica, de alguma forma, afeta os interesses das próprias populações, fazendo ouvidos surdos aos gritos da realidade, assassinatos constantes e diários, a morte como sinal cotidiano em muitos lugares da Amazônia, intenções de voltar a processos históricos de conquistas de povos pela demarcação de seus territórios, para endossar e reafirmar suas identidades “.

Todos estes elementos, “são questionados também por governos incapazes em todo sentido de respeitar e ouvir, com a cumplicidade de outros múltiplos atores, com uma intenção só, de alguma forma: autoproclamar-se como os novos Herodes da realidade, eliminando qualquer possibilidade de vida para os pequenos, que são os que tecem a esperança, e em meio a quem, sem dúvida, esta esperança de vida e advento nasce e renasce hoje “, afirma Mauricio López.

Portanto, é necessário, segundo ele, refletir sobre “o significado da espera, uma espera incerta e confiante”. É a figura de Maria na Amazônia, uma mulher jovem e simples, de seu povo, frágil, vulnerável pelas leis que pesavam nesse contexto”. Uma realidade hoje ainda presente, “Quantas mulheres na Amazônia nos falam também sobre essa esperança incerta, mas esperançosa!” Mulheres que tecem oportunidades de vida para seus filhos e filhas todos os dias, que também protegem todo o ecossistema para que continue a ser um ciclo plenificante, que são os protetoras dos rios, que também estão ajudando a fazer a vida acontecer e crescer, junto com os homens que também fazem parte desse processo. Nelas, a encarnação de Maria, com incerteza, com medo e, acima de tudo, com uma profunda vulnerabilidade de saber que são pequenas e estão sob um regime que de alguma as excluiu e as colocou em último lugar “, afirma o secretário executivo do REPAM.

Nessa situação, “o projeto do Reino e da vida decide se tornar carne”, diz Lopez, porque segundo ele, “é apenas com o seu sim corajoso, de uma mulher simples, de Maria, que o projeto do Reino se abre para toda a humanidade até hoje”, o que nos leva a nos perguntarmos: “Quais são os Sims de Maria que até hoje continuamos escutando e ressoam na floresta todos os dias, de mulheres e homens que lutam na vida cotidiana?”. Eles são SIMs que estão presentes em “mulheres indígenas e camponesas, religiosas, missionárias, juntamente com padres, bispos e outras pessoas que, todos os dias, abrem seus corações e fazem que suas entranhas sejam propícias para sentir e se comoverem pela dor da vida cotidiana e acreditar além da dor que outro mundo é possível”. São pessoas dispostas a “se pôr em caminho, com as mãos na massa, para tecer possibilidades, todos os dias, na defesa dos direitos, da identidade, transmitindo cultura, língua, trazendo o sustento diário dessa vida para a Amazônia que ressoa como possibilidade de futuro “.

Para construir esse futuro, é necessário “estar a caminho, como Maria e José, que, em meio às circunstâncias de opressão, para também ter a chance de liberdade, são obrigados a estar a caminho”, diz Mauricio Lopez. Algo que ainda está presente hoje na Amazônia, porque “quantas Marias e Josés vivem a situação da diáspora, migração e refúgio, expulsos de suas terras, porque as condições não permitem mais, porque a violência não permite ter um futuro, e deixam tudo o que têm para pegar a estrada. Arriscam tudo o que têm, a segurança, para poderem ter a chance da vida nascer. Saem de seus lugares, estão a caminho, em busca de um novo lugar. Indígenas que são expulsos de suas terras ancestrais por interesses do agronegócio, do extrativismo, e eles são, de alguma forma, forçados a viver nas periferias urbanas, sem-terra, que é a fonte de vida e dignidade para eles”.

Uma realidade que o Secretário Executivo da REPAM também descobre nos migrantes, “como no caso de tão doloroso da Venezuela, mas não só, eles têm que deixar a terra, porque não há nenhuma condição, porque a fome, violência, não os permite permanecer na terra, e pegam a estrada com o pouco que eles podem carregar. Muitas vezes levando dentro deles a esperança de possibilidades”. Por essa razão, ele se pergunta: “Quais são todos esses caminheiros que nos interpelam hoje, no Advento, e que nos convidam a estar a caminho com eles?“. Diante disso ele responde: “a corajosa defesa dos direitos humanos, a denúncia profética da Igreja, o fato de nos unirmos às vítimas, os mártires e assassinados. Estar do seu lado é estar a caminho para que o projeto do Reino possa nascer e se torne viável mesmo em terras estrangeiras”.

Devemos estar conscientes, de acordo com Mauricio Lopez, que “a relevância da Amazônia para todo o planeta, a importância de reconhecer os próprios povos que vivem nela como seus principais defensores, é também uma forma de reconhecer esse estarmos a caminhos para poder defender a vida neste advento”. Por isso, ele considera necessário “que sejamos capazes de caminhar com eles, de sentir com eles, para de alguma forma carregar a realidade, tomar conta e cuidar dela junto com eles”.

Finalmente, Mauricio Lopez nos chama a refletir sobre “o fato da encarnação, a decisão da divindade de estar presente nas condições mais inadequadas segundo o que consideraríamos os parâmetros humanos hoje”. Segundo ele, isso se concretiza “no nascimento da possibilidade do Reino e de esperança para todo o Planeta, a chegada de Jesus em um ambiente mal cheiroso, rodeado talvez de insalubridade, de animais, em uma caverna ou lugar totalmente inapropriado, como resultado da rejeição de tantas irmãs e irmãos que não são capazes de ver que a encarnação acontece lá hoje “. Ao mesmo tempo, ele vê que isso é atualizado “na Amazônia que irrompe como novo sujeito eclesial, que nos fala de si mesma como esperança e futuro, mas também como risco e vulnerabilidade, como local periférico onde a encarnação acontece”.

Isso nos leva ao Sínodo para a Amazônia, que segundo Mauricio Lopez, “coloca no coração da Igreja universal e no coração do mundo a periferia que é o centro”. Por isso, ele pergunta, “quem são os primeiros, os privilegiados?” que ele descobre nos “sensíveis e simples, os bem-aventurados, aqueles pastores que, aos olhos dessa realidade, tinham atitudes indesejáveis, ações que os impurificavam. Lá, neles e no meio deles, vem a vinda de Jesus para toda a vida, para o mundo inteiro”.

E hoje, “Quem são aqueles pequenos, considerados impuros, que às vezes são os que têm o coração mais aberto, mais sensível, que são capazes de empatizar e sentir essa realidade de fragilidade e ver a esperança de cada dia como a luta pelo pão cotidiano deles e que eles acham naquela criança que nasce como promessa de futuro?”, pergunta o Secretário Executivo da REPAM. Ele os descobre em “todas estes povos rejeitados, todas estas comunidades de periferia, que são as primeiras a reconhecer na Amazônia que a esperança está viva, que cabe a eles dar o passo para encontrá-la, que precisa tece-la e vir aqui celebrar, no meio da dor, a esperança que supera todo desespero”.

Por tudo isso, conclui Mauricio López, dizendo que “como REPAM, como Rede Eclesial Pan-Amazônica, queremos nos tornar propícios, pedindo entranhas de mãe, de Deus que é fundamentalmente Mãe, para dizer um corajoso sim como Maria, na incerteza, mas confiante, para pegar a estrada, responder a todos os sinais de exclusão e acompanhar os crucificados de hoje na Amazônia, mas sobretudo para reconhecer a esperança absoluta da encarnação que acontece, que o que antes era a periferia hoje é o centro, um sinal de vida e futuro. A Amazônia como fonte de vida para a Igreja, para o mundo e para essa possibilidade do Reino neste kairos de Deus”.

Luis Miguel Modino

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