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6ª Carta às Comunidades: “VEJAM! EU VOU CRIAR NOVO CÉU E UMA NOVA TERRA…”

Carta às Comunidades nº 06Rondonópolis/MT, 15 de outubro de 2020

Irmãos e Irmãs na da caminhada…

Entre os dias 18 a 22 de julho de 2023, na cidade de Rondonópolis/MT vai se realizar o 15º Intereclesial das Comunidades Eclesiais de Base. Mais do que um evento será a culminância de um processo de revitalização das comunidades. Daí a cada tempo uma carta circula pelas comunidades, para aprofundamento, partilha e formação.

As comunidades cristãs caminham escutando o grito profético de fé e de esperança: “Vejam! Eu vou criar novo céu e uma nova terra…” (Is 65,17ss). O profeta escreve para um povo que, após voltar do Exílio e morando de novo na terra prometida, vive uma experiência frustrante de pobreza e opressão da parte das elites religiosas e dos políticos do Império, com fome e mortes prematuras, com infidelidades, idolatrias e traições. O profeta grita, em nome de Deus: vejam, escutem, contemplem, percebam; vai ser criada uma ‘nova’ ordem cósmica, universal, para todos; é a obra do Deus criador, misericordioso e libertador.

As comunidades cristãs, guiadas pelo Espírito Santo, viram que Deus cumpriu essa e todas as suas promessas na vida concreta de Jesus. Por isso, anunciam a morte de Jesus, proclamam a sua ressurreição e vivem um novo “modo de viver” (At 5,20).

Esse ‘modo de viver’ consiste seguir Jesus, seus gestos e ensinamentos e deixar-se guiar pelo Espírito que conduziu Jesus, o Mestre. Assim os seguidores de Jesus abandonam os costumes e ‘tradições dos antigos’; e agora rezam nas casas; em lugar dos ritos do templo e das outras religiões; eles repartem o pão dando graças a Deus; não matam ‘adúlteras’, nem crianças, nem doentes, nem idosos; tratam como irmãos e irmãs a escravos e livres, a judeus e pagãos; as crianças e as mulheres abandonadas, os doentes e idosos recebem o que necessitam; os ‘mendigos cegos de nascença’, os fugitivos e os migrantes não têm que pedir esmola ou vender seus corpos, pois a comunidade reparte o que tem; e a ‘salvação’ entra em casas de alguns ricos que dão aos pobres a metade dos seus bens. Nas comunidades, se vive a linguagem do amor. Do ponto de vista sociológico, “o cristianismo revitalizou a vida nas cidades greco-romanas, oferecendo novos costumes e novas formas de relação social, capazes de fazer frente aos muitos problemas urbanos”.

São Lucas informa que os apóstolos ficaram em Jerusalém e depois “se espalharam pelas regiões da Judéia e da Samaria” (At 8,1); e criaram comunidades em parte do Império Romano. A Igreja nasce da missão. A Palavra crescia pelo testemunho de vida e pelas “conversas sobre a Boa Notícia” de comerciantes, fugitivos da guerra e soldados. Anunciavam o querigma nas sinagogas e nas praças, nos mercados e nos locais de trabalhos, nas rodas de conversa, nas viagens… ‘Conversar o evangelho’ consistiu certamente em algo mais que palavras, pois a mensagem implicava a vida inteira.

Os/as cristãos/as contam as suas próprias experiências de fé em Jesus. Não fazem palestras nem lucubrações filosóficas ou teológicas, nem sermões sobre doutrinas ou novas leis morais. Esse anúncio e esse modo de viver chamam a atenção, provocam a alegria dos pobres e pecadores e a ira dos poderosos, dos guardiães da ordem pública. Os cristãos testemunham as consequências concretas da sua fé em Jesus; mostram a universalidade do amor de Deus e a unidade do gênero humano; o valor da solidariedade; fortalecem a esperança dos pobres e o valor da vida em comunidade; e revelam o sentido da ‘cruz de cada dia’ e da ressurreição.

O Papa Paulo VI, em 1975, falando da “evangelização no mundo de hoje”, ensinava que o processo da evangelização começa com o testemunho de vida e o descrevia assim: “um cristão ou um punhado de cristãos […], no seio da comunidade humana em que vivem, manifestam a sua capacidade de compreensão e de acolhimento, a sua comunhão de vida e de destino com os demais, a sua solidariedade nos esforços de todos para tudo aquilo que é nobre e bom […]”. E prossegue descrevendo o diálogo evangelizador: “Por força deste testemunho sem palavras, estes cristãos fazem aflorar no coração daqueles que os veem viver, perguntas indeclináveis: Por que é que eles são assim? Por que é que eles vivem daquela maneira? O que é, ou quem é, que os inspira? Por que é que eles estão conosco?” (EN 21). Nesse diálogo começa o anúncio explícito do evangelho de Jesus Cristo; e poderá continuar-se no convite a entrar na comunidade e a participar de vida da comunidade e a engajar-se na construção do Reino.

As nossas comunidades são lugares de partilha. Nesta carta queremos partilhar experiências da fé que “age pelo amor” (Gal 5,6). E para isso vamos inspirar-nos nos que faziam os primeiros cristãos: testemunhavam Jesus Cristo e viviam um novo modo de viver (At 5,20).

As pessoas gostam de partilhar as histórias de sua vida: suas alegrias e esperanças, seus sofrimentos e vitórias; quem ajudou e quem os atrapalhou na sua caminhada; quando experimentaram a acolhida e fraternidade. Também gostam de contar sua caminhada de fé: quem lhes ensinou a rezar, a ler a Bíblia e a viver o Evangelho; quem o/a convidou para participar da comunidade; que o/a incentivou a comprometer-se no serviço aos outros…

Esta carta quer incentivar as pequenas comunidades a partilhar as experiências de fé vividas pelos ‘discípulos e discípulas’ de hoje, as experiências dos ‘samaritanos de hoje’, dos ‘zaqueus’, dos ‘mártires’ e dos que levam a Boa Notícia aos pobres e defendem seus direitos; dos que lutam por um mundo novo; dos que constroem a paz e dos que reconciliam os inimigos; dos que acolhem e servem os mais pobres nas suas casas; e dos que ensinam aos ‘novos’ a ter fé e confiança, paciência e esperança, e a comprometer-se com a transformação do mundo; gente que cria alegria e esperança.  Como diz o Papa Francisco: “os santos que nos encorajam e acompanham”, “os santos ao pé da porta”; e, “entre tais testemunhas, podem estar a nossa própria mãe, uma avó ou outras pessoas próximas de nós (cf. 2 Tm 1, 5)”. (GE, 3-9).

É isso que fizeram os santos e santas, cada um do seu jeito. Com humildade, com ações concretas e com objetivos bem definidos; ações simples e corajosas, humildes e ‘escondidas’, sempre para servir os últimos. Os exemplos que Jesus coloca são de ‘gente comum’, que pode ser imitada por cada um de nós: o pai que dá pão em lugar de pedra; o pastor que busca a ovelha perdida; a mulher que faz pão; o semeador que esbanja boas sementes. Assim são as narrativas de toda Bíblia.

Podemos partilhar as experiências das pessoas que superam as tentações do aparecer, do consumismo, do individualismo, da indiferença, da acomodação, da fuga da realidade, da desesperança. Precisamos saber como as pessoas adquirem a ‘consciência crítica’; como reagem diante dos preconceitos e fanatismos, das perseguições e obstáculos; quem ajuda o povo a tomar consciência e a ficar firme; como sair da mesmice de uma ‘vida tranquila’ sem compromisso…

De fato, nas comunidades, partilhamos nossa vida diária, nossos desejos e projetos e fazemos a ‘memória subversiva’ dos mártires do povo e, às vezes, ficamos apenas na admiração de ‘heróis inimitáveis’. Porém, poucas vezes partilhamos a nossa própria experiência de fé, nossa vivência do Evangelho, aquilo que me/nos motiva a crer e a agir, a esperar e a entregar a vida por amor.            

Em cada comunidade, podemos partilhar as experiências próprias de cada um dos irmãos e de cada uma das irmãs, a caminhada de fé de nossas comunidades e as experiências de muitas outras pessoas. É desejável fazer isso nas reuniões e encontros, nas celebrações litúrgicas e nos encontros de catequese. E, saindo do nosso mundo, seria bom fazer como os primeiros cristãos: ‘conversar sobre o Evangelho nas ‘rodas de conversa’, na família, nos grupos de amigos.

Podemos partilhar também as histórias da caminhada de fé das nossas comunidades: que rezam e acolhem, celebram ritos litúrgicos e sociais, escutam as tristezas e angústias de todos e todas, e se empenham nas lutas pelos direitos humanos. É muito bom conhecer a história da nossa Comunidade. Precisamos ouvir as histórias de como unir e fortalecer os pequenos grupos, para que se tornem ‘pequenas comunidades missionárias’, ‘casas’, de comunhão e missão, onde é possível sentar-nos juntos, falar, discutir e buscar caminhos, escutar e acolher as alegrias e esperanças, tristezas e angústias dos homens e mulheres de hoje; participar em todas as iniciativas que deem vida aos pobres; e onde todos e todas sejam considerados como sujeitos de transformação na Igreja e no mundo. ‘Casas’ de portas abertas para acolher a todos e todas e abertas para sair para servir os irmãos…

Temos que contar, também as histórias dos ‘herodes’ e ‘caifás’, dos ‘guias cegos’ e dos ‘fariseus’ de hoje, os que enganam o povo; os que criam preconceitos e ilusões falsas; os que espalham falsas doutrinas sobre a salvação e criam medo do inferno e do diabo, criam desunião, violência e ódio,…

Se fizermos a partilha do pão e da palavra, da fé e da esperança, do amor e do serviço, veremos o novo céu e uma nova terra. Se não fizermos as partilhas da nossa vida de fé…

Roda de conversa:
  1.  As nossas ações e atitudes criam esperança entre os pobres? Os pobres sentem na própria pele, no dia a dia, o amor de Deus?
  2. As reuniões, as palestras e os dias de estudo e formação, nossos retiros e celebrações litúrgicas, nos despertam para estarmos firmes na fé, sustentam nossa esperança e nos encorajam para servir os mais necessitados?
  3. Nossas ações e nossas ‘conversas’ e diálogos, dentro e fora da comunidade, levam a ‘Alegria do Evangelho’ aos que a necessitam?

Encerrar:

Pode-se encerrar contando e rezando, a história de Maria, uma mulher de um povoado insignificante, que profetiza para uma idosa grávida, no último lugar do mundo, que Deus derrubará os poderosos e exaltará os humildes, porque Deus é santo, não esquece nunca do povo, pois é fiel e misericordioso.

Secretariado do 15º Intereclesial das CEBs
(Contribuição do Pe. José Cobo Fernandes)

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