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Estudar e fazer vida a Laudato Sí para mostrar a Amazônia como lugar de luta, resistência e esperança

Seminário Geral sobre a Laudato Sí de 17 a 19 de novembro em Brasília

A realidade da Amazônia está determinada pelos gritos de seus povos.

A Rede Eclesial PanAmazônica (REPAM), nasceu como “um serviço que quer articular o Povo de Deus na Pan Amazonia”, segundo o Cardeal Cláudio Hummes, Presidente da entidade, tendo como objetivo “a evangelização da Pan Amazonia dentro da realidade amazônica socioambiental, cultural daqueles povos”, promovendo uma dinâmica em que partindo da base, junto com o povo, “ninguém sinta-se isolado”.

Dom Cláudio Hummes não duvida em afirmar que “se trata de definir juntos o caminho a ser percorrido”, pois a REPAM é “o Povo de Deus articulado”. Nesse sentido, o Sínodo dos Bispos para a Pan Amazonia, convocado recentemente pelo Papa Francisco, vai ajudar à própria Igreja a tomar consciência da importância da Amazônia e vai se tornar um momento decisivo na história da região, como reconhece Dom Erwin Kräutler, Presidente da REPAM-Brasil.

Um dos grandes aportes da REPAM-Brasil nos últimos tempos tem sido a organização de quinze Seminários sobre a Laudato Sí, onde segundo Dom Erwin Kräutler, “a própria encíclica se tornou tema das reflexões”. Essa experiência foi iniciada em junho de 2016 e até setembro de 2017 tem reunido em todos os cantos da Amazônia uma ampla representação da Igreja e a sociedade amazônica.

Falar da Laudato Si, em opinião de Roberto Malvezzi, assessor da REPAM-Brasil, é se referir a “uma carta sem precedentes na história da Igreja, nunca a Igreja tinha elaborado um documento com essa metodologia orgânica, sistemática, política”, o que supõe “uma surpresa positiva única, e por isso causa tanta provocação em nível interno da Igreja e na sociedade como um todo”, definindo a carta do Papa como “um kairós para a Igreja e para o mundo inteiro”.

O Seminário Geral sobre a Laudato Sí reuniu de 17 a 19 de novembro em Brasília representantes dos quinze seminários organizados na Amazônia Legal. Junto com eles se fizeram presentes alguns membros da Rede Eclesial da Bacia do Congo (REBAC), que fazem um trabalho similar no continente africano, no propósito de descobrir elementos comuns e intercambiar perspectivas.

Mauricio López, Secretario Executivo da REPAM, ao apresentar a Rede Eclesial Pan Amazónica, constatava que ela é um instrumento para promover a conversão ecológica, que nasce de uma profunda metanoia, que nos leva a recuperar a história para compreender a realidade e que a gente vive. Nesse sentido, se torna necessário insistir em sus identidade e do trabalho em rede, independentemente das diferentes tessituras em que a Rede se concretiza nos diversos países. Tudo isso na busca de uma maior incidência dentro da Igreja e de um diálogo e trabalho em comum com diferentes organizações da sociedade civil, que ajude a superar toda tentação de fragmentação.

A realidade da Amazônia está determinada pelos gritos de seus povos, segundo a socióloga Márcia de Oliveira, que nascem da apertura de estradas para favorecer o agronegôcio e os grandes projetos, o que provoca conflitos socioambientais e um alto fluxo migratório. Essa realidade, junto de tudo aquilo que foi discutido nos seminários, iluminado desde a Palavra de Deus, provocou uma reflexão em diferentes oficinas temáticas sobre problemáticas presentes na região: terra, água e territórios; saberes e espiritualidade dos povos da Amazônia; formação pastoral e incidência política; questão urbana; mulheres na Amazônia; fluxos migratórios e tráfico de pessoas.

A importância do seminário está, segundo o bispo de Roraima, Dom Mário Antônio da Silva, no fato de “reunir todas as conclusões sobre todos os compromissos assumidos em nossas Igrejas locais e, ao mesmo tempo, nos reanimar e fazer estar interligados, interconectados, reunidos e unidos para que as conclusões possam provocar novas ações em nossa Amazônia e na PanAmazônia”, sendo um momento que possa ajudar a “enfrentar aquilo que é nocivo para a PanAmazônia, sobretudo para as pessoas e toda a obra da Criação”.

Nesse sentido, os seminários têm ajudado a tomar consciência de que “a floresta não é uma propriedade e sim um espaço vital”, como foi afirmado no Seminário celebrado em Manaus em julho de 2016, que “a dominação é algo histórico e presente na Amazônia”, com uma presença colonizadora que impus “outros valores baseados nas relações de poder e dominação” constatando que hoje “a Amazônia é vista como lugar de exploração dos recursos existentes por poderosos grupos econômicos transnacionais”.

Frente a essa realidade, os encontros sobre a Laudato Sí têm servido para lembrar que na Amazônia “existe uma história de luta e resistência”, manifestada em “experiências coletivas que vão abrindo caminhos alternativos”. Ao mesmo tempo, tem ajudado a criar uma serie de posturas de base que podem favorecer a construção do futuro, como é a conversão ecológica, retomar atitudes proféticas ou alimentar a esperança em meio da escuridão.


A REPAM-Brasil pede “que sejam escutados os clamores dos povos, constatar que é necessária uma maior mobilização da sociedade civil organizada e que seja respeitado o direito à informação”, sobretudo naquilo que faz referência aos impactos socioambientais provocados pelos grandes projetos, cada vez mais presentes na região e que provoca vítimas nos povos e comunidades tradicionais, que sofrem as conseqüências da violência no campo, a monocultura, a migração forçada e o tráfico humano.

As cidades da Amazônia são vítimas do “cada vez maior deterioro da qualidade de vida”. Junto com isso, tem-se instaurado na Amazônia um “modelo de desenvolvimento que tem como conseqüência uma crescente desigualdade e injustiça social e ambiental”, que disfarçado de progresso, acaba com a vida social e cultural amazônica, usurpa os territórios, precariza a vida, especialmente dos coletivos mais vulneráveis, crianças, adolescentes e jovens, indígenas, migrantes e vítimas do tráfico humano.

Diante dessa realidade, os seminários ajudaram a constatar a necessidade de agir na defesa dos direitos e da vida das comunidades tradicionais e urbanas, intensificando as ações locais, acompanhando os povos da floresta, sendo presença eclesial solidária que valoriza os ricos elementos presentes, lutando por uma educação de qualidade, prestando atenção especial nas lutas e iniciativas das mulheres.

Como Rede Eclesial tem-se constatado que é precisa uma articulação que enfrente os abusos de autoridade, que lute contra a destruição da vida em todos os níveis, que se faça presente nas fronteiras, que mobilize os trabalhadores, combata a exploração de menores, prevenindo toda forma de violência, cuide das juventudes.


Os seminários sobre a Laudato Si têm constatado que é preciso fomentar processos de formação, enfrentar os grandes projetos e buscar a regularização da terra, organizar a sociedade para lutar por políticas públicas, fomentar alternativas de Bem Viver, ampliar a REPAM e se comprometer com seus objetivos. É necessário concretizar todos os elementos num agir que construa e faça possível que surjam perspectivas de continuidade, que se expressem num definir ações e uma maior articulação em rede, partindo dos diferentes eixos de trabalho.

Sem duvida, o Sínodo da Pan Amazonia, uma reflexão que também se fez presente no encontro, vai ser momento decisivo no futuro da Igreja da região e em seu processo de evangelização. Nesse andamento, a REPAM, cujos trabalhos suscitam um constante interesse no Papa Francisco, como constatava o Cardeal Hummes, pode ser um dos principais interlocutores, pois esse trabalho em rede e de mapeamento da realidade amazônica está ajudando a ter um melhor conhecimento de toda a vida que a Amazônia e seus povos encerram.

Por Luis Miguel Modino

Fotos arquivos web (redes sociais)

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