Leituras: 2Rs 4,42-44 – Sl 144 – Ef 4,1-6 – Jo 6,1-15
Por Quininha Fernandes Pinto, do Regional Leste 1.
O problema da fome no mundo é certamente uma das questões mais angustiantes do nosso tempo. Mata mais que guerras e pandemias. Sua solução está longe de ser resolvida. O desequilíbrio econômico entre as nações desenvolvidas e as outras mais pobres continua a registrar crescimento assustador. O auxílio econômico oferecido pelas nações ricas às pobres, assim como o chamado auxílio emergencial no Brasil por conta da Covid, é ainda muito fraco, mal orientado e até humilhante, dadas as necessidades básicas de sobrevivência que tais auxílios não conseguem atingir.
As leituras deste domingo falam de fome, de multidão faminta, da escassez de “pão”, da necessária fraternidade, da urgência em multiplicar os alimentos, da imperiosa postura ética da partilha. A passagem é conhecida. O povo seguia Jesus, e em determinado momento Jesus percebeu a necessidade de alimentar aquele povo que estava com fome. Tinham pouco dinheiro e muita fome para saciar… Jesus realiza o sinal de multiplicar o que tinham de concreto… Um menino possuía cinco pães e dois peixes. Claro que outros também possuíam alguma merendinha… muitos nada tinham. É próprio das pessoas – sobretudo as mais simples – levarem algo para comer na viagem. E também é próprio dos pobres dividir o pouco que têm. Jesus realiza o milagre da partilha. Ele toca o coração daquele “menino”, do “menino” da “criança” que cada um leva no seu coração e os alimentos são colocados em comum, na relva da vida, no chão do nosso cotidiano, e todos comem, ficam saciados e ainda sobra muita comida…
Jesus saciou concretamente pessoas famintas e, revelou-se como o pão da vida eterna, mas o fez a partir de uma realidade terrestre. O pão que Ele dá não é só o símbolo do pão sobrenatural, do pão eucarístico. Não é possível revelar o pão da vida eterna sem comprometer-se verdadeiramente nos deveres da solidariedade humana. Um não está desvinculado do outro, ao contrário, um identifica e dá sentido ao outro. O amor aos pobres, como o amor aos inimigos, é o “teste” por excelência da qualidade da nossa fé, do tamanho da nossa espiritualidades, da grandeza do nosso amor a Deus. Reconhecer e favorecer a concretude alimentar dos famintos é engajar-se totalmente nas exigências do amor. Este é, portanto, o grande desafio colocado pelas leituras da liturgia deste domingo: traduzir para os nossos dias a necessidade de uma “nova multiplicação dos pães”, em escala mundial.
A ideia de abundância e de saciedade é fortemente acentuada tanto no evangelho quanto na 1a leitura: “comerão e ainda sobrará”. O símbolo dos 12 cestos que encheram com as sobras, anuncia que as 12 tribos de Israel não conhecerá mais a fome, a miséria, pois haverá fartura para todos…
Não raramente acostumamo-nos a imaginar o gesto da multiplicação dos pães de uma forma mágica: Jesus fechando os olhos, abençoando e automaticamente pãezinhos pipocando por todos os lados… e todos correndo… apanhando pão e peixes aleatoriamente. O grande milagre feito por Jesus foi tocar os corações daqueles que possuíam algo para colocarem em comum, para o milagre da partilha, da solidariedade, da compaixão. O grande milagre que somos desafiados a fazer é exatamente este… abrir o coração, a “nossa dispensa” e tirar dali o alimento para a multidão de irmãos/ãs que têm fome, e tantas fomes!!!!
Também, e não raramente, doamos uma cesta básica aos pobres e dormimos o sono dos justos, achando que fizemos a nossa parte. Se têm fome, a cesta básica é bem vinda, mas é pouco! No gesto da partilha fraterna podemos partilhar e fazer multiplicar a nossa sensibilidade, o nosso olhar para as demais necessidades dos irmãos, o nosso tempo e o nosso saber, nossa fraternura, as nossas influências de relacionamentos, a nossa voz… O desafio de “multiplicar os pães e os peixes” passa pela fartura de justiça, pela prática da equidade, pela criação de oportunidades diferenciadas para todos…
Que possamos pensar na melhor forma de “multiplicar” hoje o pão da vida para aqueles/as que vivem abaixo da linha da pobreza/miséria, que têm fome de inclusão e aceitação social, que morrem de fome de afeto, de teto, de respeito, de visibilidade. Que a exemplo dos pobres, sejamos mais humanos, mais solidários, mais cristãos.
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