A igreja católica lança neste ano mais uma Campanha da Fraternidade, com o tema “Fraternidade e Políticas Públicas” e o lema “Serás libertado pelo direito e pela justiça” (Is, 1, 27). A CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) convida a todos os cristãos católicos a uma corrente de celebração, oração e reflexão sobre os reais problemas que afligem grande parte da população brasileira.

Cada ano a CNBB lança junto com a Campanha da Fraternidade um tema que tenha relação com os problemas sociais. E neste ano, a igreja convida os cristãos para uma reflexão profunda dentro do método ver, julgar e agir, sobre as políticas públicas. E por que houve essa preocupação com as políticas públicas? Primeiramente, o órgão responsável pela Campanha da Fraternidade ligado à CNBB faz pesquisas e estudos sobre o tema, muito antes de ser lançada a campanha.

Há toda uma produção de material, como o texto-base e os subsídios, para que a maioria da população possa ter acesso. Nesses estudos são apresentados uma série de reflexões, uma série de dados estatísticos, para se ter uma ideia de como anda a situação brasileira quando se trata das políticas públicas.

 

A igreja católica lança neste ano mais uma Campanha da Fraternidade, com o tema “Fraternidade e Políticas Públicas” e o lema “Serás libertado pelo direito e pela justiça” (Is, 1, 27)

 

Tem-se assim que a produção de material da Campanha da Fraternidade possui um alto nível de qualidade e procura acima de tudo se aproximar da realidade em que vive a população brasileira. Foi a partir desses estudos e dessas pesquisas que se chegou a esse tema da Campanha da Fraternidade de 2019.

É importante destacar a grande importância da Campanha da Fraternidade para uma vivência cristã mais próxima do povo sofrido e marginalizado de nossa sociedade. Tem alguns cristãos católicos que não aprovam a Campanha da Fraternidade. Tem padres que durante a quaresma nem se quer tocam no assunto da Campanha da Fraternidade. Esses padres muitas vezes apenas cumprem a obrigação no último dia da quaresma de distribuir os envelopes de arrecadação da campanha.

Isso tudo acho um verdadeiro absurdo, falta de compreensão sobre o verdadeiro sentido de ser cristão. A essas pessoas falta conhecer melhor a igreja, bem como a sua história e as decisões que são tomadas por meio de longos debates e reflexões. Essas pessoas infelizmente assumem uma postura isolada, individualista, omissa, porque não querem assumir compromissos e acham que o papel do cristão é de apenas rezar e celebrar.

E é bom saber que há estudos teológicos de muitos anos que negam essa visão de ser cristão apenas no sentido espiritualista. Pelo contrário, o cristão deve primar pela oração e pela sua espiritualidade, mas isso precisa ser conjugado com suas ações, com seus compromissos pastorais, com suas lutas em favor dos que mais sofrem, até porque dizia Paulo: “A fé sem obras é morta”.

Os importantes documentos da igreja, como o do Concílio Vaticano II, os documentos de Medellín, de Puebla e São Domingos chamam a atenção sobre o verdadeiro papel do cristão e o seu compromisso social. Desde o Vaticano II a igreja chama a atenção pela sua missão evangelizadora, de pregar o evangelho, mas acima de tudo ter uma vivência profética. A vivência profética do cristão se coloca no verdadeiro sentido do que seja o profeta.

 

O cristão deve primar pela oração e pela sua espiritualidade, mas isso precisa ser conjugado com suas ações, com seus compromissos pastorais, com suas lutas em favor dos que mais sofrem, até porque dizia Paulo: “A fé sem obras é morta”

 

O profeta é entendido como aquele que anuncia a palavra de Deus, mas é também aquele que denuncia as injustiças. Assim fizeram os grandes e os menores profetas do antigo testamento. Não é à toa que o lema da campanha deste ano é do profeta Isaías: “Serás libertado pelo direito e pela justiça”. Esse lema resume o que se espera das políticas públicas: que as políticas sejam pautadas no sentido de se garantir os direitos da população mais pobre, e que esses direitos sejam implementados tendo como bandeira a justiça.

 

Penso que essa Campanha da Fraternidade deste ano, tendo como enfoque os problemas relacionados às políticas públicas, veio em um momento bastante oportuno. O Brasil vem sofrendo muito devido a inúmeras falhas dos órgãos públicos em atendimento à população mais pobre. As dificuldades são imensas, na falta de atendimento à saúde, à educação, aos idosos, às mulheres (principalmente quando se trata da violência contra elas), e na existência de discriminações e preconceitos.

O governo atual e muitos de seus apoiadores, claro, veem nesses tipos de discussões questões ideológicas que julgam ser coisas de comunistas e ligadas ao PT. Essas falácias são puras aberrações de pessoas ignorantes. Isso não existe. A preocupação da igreja é com os pobres, os mais sofridos, e todos os cristãos, querendo ou não, têm e devem ter esse compromisso de ajuda aos mais sofridos.

Não podemos negar a vida de Jesus aqui na Terra. Jesus se preocupou com aqueles que sofrem e vivem à margem da nossa sociedade. Assim foram as curas que ele fez, as suas bem-aventuranças, o seu posicionamento diante dos fariseus chamando-os de sepulcros caiados. Jesus, além de sua vida santa, assumiu posições, sempre em favor da justiça e das pessoas que mais sofriam em sua época.

Não há condições de negar esse Jesus. Não há condições de negar a simplicidade e a humildade de Jesus. Mas na hora de agir ele se mostrou corajoso, como foi o momento de pegar o chicote e expulsar os vendilhões do templo. Esse é o verdadeiro papel do cristão. Rezar, pedir e agradecer a Deus na oração, mas também agir e assumir o compromisso como missionário de Cristo.

Aparecido de Assis, professor de Filosofia da Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat)/campus de Cáceres. Texto publicado originalmente no https://cidoassis.blogspot.com