É com esse Lema que pelo 25º ano O grito dos/as excluídos/as, iniciativa da CNBB, convida a sociedade brasileira a elevar sua voz, protestar, vociferar contra essa “ditadura sutil” que o atual governo está implantando no Brasil. Todo sistema centrado em si mesmo converte o “dinheiro em esterco do diabo”, lembra papa Francisco. É preciso questionar a obsessão pelo crescimento puramente econômico do capitalismo. Pois sua cegueira está levando a sociedade a um fracasso brutal, e é responsável por quase todos as tragédias humanas e ambientais que estamos vivendo.

A crise que assola os pobres é fruto de um sistema sociopolítico que despreza o ser humano. O grito dos pobres, é o grito da terra, é o grito de Deus. “Estar com os pobres é Evangelho, não é comunismo”, ensina papa Francisco. Quais são os gritos que nos unem em defesa da justiça, dos direitos e da liberdade? Indignação! Sobram motivos para gritar.

O grito dos famintos.

Na última sexta-feira (30/8), em Salvador, moradores levaram para casa carne de uma baleia morta após encalhar na praia. O fantasma da fome voltou. O relatório internacional O estado da segurança alimentar e nutrição no mundo 2018, da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), mostrou que a fome atinge 5,2 milhões de pessoas no Brasil.

O grito dos trabalhadores.

O número de desempregados ultrapassa os 12 milhões. Se considerados aqueles que estão subempregados ou desistiram de procurar trabalho, o total de afetados chega a 28,4 milhões, um em cada 10 brasileiros economicamente ativos estão sem trabalho. Neste processo acelerado de deterioração do trabalho, a realidade também aponta para o expressivo aumento do número de trabalhadores informais. São milhões de vendedores ambulantes, empregados de pequenos negócios (sem carteira assinada), motoristas de aplicativos e entregadores (“uberização”). Marginalização do emprego! Fim dos direitos fundamentais, resultados da reforma trabalhista. E o governo promete mais reforma. Nunca o panorama do mundo do trabalho foi tão sombrio.

O grito da educação e da cultura.

Corte e congelamento nas verbas das universidades federais. A desculpa é priorizar o ensino básico, especialmente a educação infantil, alfabetização e o ensino profissional. No entanto, essas áreas também não escaparam dos cortes, 680 milhões de reais. Mais cortes foram anunciados: 5.613 bolsas de mestrado, doutorado e pós-doutorado deixam de ser oferecidas. Governo tira R$ 1 bilhão da educação para pagar deputados pela reforma da Previdência.

O grito dos sem casa.

Estamos entre os cinco países com o maior déficit habitacional do planeta: 7,78 milhões, segundo levantamento da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) em parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV). O fato está associado ao alto índice de desemprego, queda da renda familiar e a redução do crédito imobiliário. Não existe política habitacional. A que existia foi desmantelada. O programa habitacional Minha casa minha vida sofrerá uma redução drástica: De R$ 4,6 bilhões para R$ 2,7 bilhões em 2020. “Nós não vamos admitir uma cidade, uma praça que esteja cheia de morador de rua” e não vamos mesmo, comandante Nádia! Realmente as ruas e as praças são para cães e não para seres humanos! A cidade é de todos e todas!

O grito das minorias e das mulheres que sofrem todas as formas de discriminação e violência.

O Brasil registra uma morte por homofobia a cada 16 horas, segundo a Diretoria de Promoção dos Direitos LGBT do Ministério dos Direitos Humanos. O Atlas da violência computou, em média, 13 mulheres assassinadas por dia. A maior parte é vítima de violência doméstica.

A natureza grita!

Os incêndios na Amazônia são crime contra a humanidade. Foram registrados até 1º de setembro 91.891 focos de queimada, 50% deles na Amazônia. Só em agosto foram mais de 30 mil focos. Em risco mais de 30 mil tipos de plantas, 2,5 mil espécies de peixes, 1,5 mil de aves, 500 de mamíferos, 550 espécies de répteis. Não podemos esquecer o ecocídio cometido pela Vale em Mariana e Brumadinho! Gritemos por uma “ecologia integral”.

Intolerância religiosa, desmonte da Previdência Social, famílias obrigadas a deixar suas terras e casas para fugir de conflitos, refugiados climáticos, exploração das terras indígenas, racismo, homofobia, saúde pública caótica. Todos são gritos de excluídos de um sistema que mata em nome do lucro. “Esse sistema não vale”.

Em nota a CNBB alerta: “Os direitos e os avanços democráticos conquistados nas últimas décadas, fruto de mobilizações e lutas, estão ameaçados… O próprio sistema democrático está em crise, distante da realidade vivida pela população. O grito precisa colaborar para  gerar processos de conscientização e de mobilização social e de profecia da Igreja em defesa dos mais vulneráveis… Precisamos continuar a gritar pela vida em  primeiro  lugar”. Que o cristão desperte “para a solidariedade, para a organização”, para a luta “que renova a esperança dos pobres e os torna sujeitos de uma nova sociedade, sinal do Reino de Deus”.

Grite, gritemos por esperança, justiça, direitos e liberdade! Uma andorinha só não faz verão!

Sobre o autor:

Prof. dr. pe. Élio Gasda, Sj

Élio Estanislau Gasda é jesuíta, doutor em Teologia, professor e pesquisador na Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE). Autor de: Trabalho e capitalismo global: atualidade da Doutrina social da Igreja (Paulinas, 2001); Cristianismo e economia (Paulinas, 2016); Economia e bem comum: O cristianismo e uma ética da empresa no capitalismo (Paulus, 2016)

Fontes:

www.domtotal.com